“Mildelesas” da vida

É estranho celebrar aniversário num tempo pandêmico. Nesses últimos dois anos foi assim, anoitecer e amanhecer agradecendo por estar viva, embora em alguns momentos cercada de tristeza e temor. Nesses tempos duros há muitas pessoas amadas que anoiteceram e não amanheceram. Nunca fui apoteótica em aniversários. A discrição das datas particulares sempre foi algo que

A lógica natural dos ventos

Enquanto eu escrevo mais de 500 mil pessoas no Brasil morreram. Desde que o coronavírus chegou por aqui, diariamente escutamos o lamento de alguém querido externando a dor pela perda de pessoas amadas. Penso que sejam mais, muito mais que 500 mil pessoas. Nos falta precisão de dados, testagens suficientes, responsabilidade, seriedade e compromisso. Nos

Vestida de tempo & mar

O tempo é um pássaro a sobrevoar o céu de nossas almas. E por vezes do poente, “da janela lateral do quarto de dormir” paro absorta a contemplar a paleta de cores a se desmanchar a cada crepúsculo. Observo o tempo no corpo, em especial no útero, nesse ciclo interior de chegada e partida. Penso

Cinza e laranja

Há dias em que a realidade te atropela. Momentos em que a “gente se sente como quem partir ou morreu”. Tão precisa música do Chico Buarque a descrever a roda viva. É uma criança que morre tragicamente. São três crianças negras desaparecidas, até então não encontradas. É vacina que falta. É cepa nova que chega.

Vestígios dos dias

Gosto da cronologia, linear, daquelas que a gente marca no calendário. Dos dias nos quais o inusitado acontece e simboliza algo que vai te acompanhar a vida inteira. É aquele número repetido que ano após anos consegue te emocionar. Sou daquelas que lembra que os números representam algum acontecimento, paisagem, sabor, cheiro, raiva, alegria. Não

Torto Arado

Há alguns meses que vinha escutando Itamar Vieira Júnior, pelo fenômeno literário de Torto Arado (Todavia, 2019). Foi escuta do podcast da Revista Literária 451, depois entrevista no programa Roda Viva, e outras entrevistas do autor. Com curiosidade fui vendo os posts, inúmeros em redes sociais, com mídia espontânea ou patrocinada pela editora. Fiquei muito

Anormal

Nunca tive uma visão sobre mim pautada no senso comum do que pensavam sobre ser: sertaneja, mulher, protestante, de raízes indígenas sem viver numa aldeia, jornalista, cientista… E durante um momento enquanto cozinhava uma das centenas de almoços que já fiz nesse isolamento social, pensando sobre a escrita dessa coluna, fiquei me questionando sobre meu

Infantilidades

Sempre que vejo uma mulher grávida ou uma criança, intimamente eu fecho os olhos. É a mesma sensação de quando vejo uma estrela cadente iluminar os céus. É uma emoção. Peço para Deus guiar a vida daquele ser. Quando olho às vezes para uma pessoa adulta, fico pensando na criança que um dia ela foi.